Prosa e poesia trabalham com intuições, mas possuem fins diferentes. O objeto do narrador é o real; o do poeta, a verdade. Enquanto o primeiro cria representações exemplares do mundo, o segundo erige um dizer preciso de cuja mensagem não se pode mais escapulir. Ela nos impregna inteira e nos comunica fundo o sentido de sua instauração.
Fazemos esse breve definitório para depor em favor da poesia de Diego Moraes que, não sem frequência, é espezinhada e desvalida por força ora das estripulias do autor, ora dos seus versos. Das primeiras, não vamos cuidar aqui. Não somos juízes nem fiscais da vida dos outros. Já no segundo ponto cabe nossa atenção.
Há quem dê pouca importância a sua obra afirmando ser esta um pastiche, um simulacro inacabado de Bukowski, aguardando na fila do reconhecimento com outros mil Bukowskis sonhadores. Outros dizem apenas que seus temas são juvenis, coisa de adolescência mal resolvida. Seguem esses os que falam que seus textos carecem de elaboração, ou que em algum ponto se tornam enfadonhos e repetitivos. Outros só os leem e olham-nos como um signo nada moral da impertinência.
Mas isso tudo se apaga quando os interpretamos sob o intuito próprio da produção da poesia. Tomados em sua posição fundamental, os seus versos imediatamente se justificam, posto que há no mundo sim, apesar do que dizem os empreendedores, a juventude, as drogas, o desespero, o sexo, a petulância, a imaturidade, a sujeira, a briga, todos esses sinais à espera de uma palavra que os possa afirmar por inteiro, em sendo exatamente isso o que cada linha de Moraes busca:
CARCEREIRO
Você pode ficar sozinha
Trancada num quarto cheio
De ursinhos de pelúcia
Você pode ficar sozinha
Escutando Radiohead
Você pode ficar muda
Brincando de cortar os pulsos com gilete
Mas lá fora os cães latem meu nome
O amor é um carcereiro que
Prende a gente e joga a chave fora.
Poderia o poema acima ter sido escrito por um sobrinho de quinze anos? Talvez. Mas acontece que não foi, e, pelo contrário, através da voz de Moraes que tivemos a mensagem aí concebida, a qual nos remete invariável ao espírito de um jovem que vive autenticamente o drama de sua idade e de uma busca incessante para ter a palavra que diga isso com clareza, razão pela qual os versos dizem a esse garoto e também a cada leitor, posto a escritura do poeta ser capaz de nos dar essa visão universal da maneira mais nítida.
É isso o que a poesia faz, e o que ela sempre quer. E é por essa razão que ela é retomada constantemente por nós apesar de seu lume não mais existir, como dizem muitos. Assim, contra as forças cultas e ocultas, a poesia de Diego Moraes segue seu caminho. A verdade vomitada na sarjeta. A canção do disco da avó na garganta de um rosto prenhe de lágrimas e espinhas.
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