Conceito fundante na composição do fazer narrativo e literário, a imitação tem sido constantemente substituída ou aplicada como sinônimo de representação, ou, em alguns casos mais radicais, assumida como compreensão limitada do trabalho representativo da arte, a qual, no fim das contas, sempre tratou em suas bases do ofício de representar.
Sem querer entrar em tantos detalhes retrospectivos, é de se considerar que alguma diferença pode ser tida como válida entre os dois termos, no que aqui será aventada a hipótese dessa dissociação, bem como a presunção de que a literatura executa em momentos separados tanto um quanto outro procedimento, o que não exclui a hipótese de surgirem juntos. De todo modo, o que vale pensar é que estamos articulando definições distintas.
Imitar é reproduzir. O imitador sempre é aquele que busca fazer com que algo surja da maneira mais idêntica possível ao seu original ou modelo. Assim, ele não nutre a ambição de que seu invento supere ou ultrapasse a coisa, e sim que se aproxime ao máximo desta. Sua meta é a fiel reconstrução.
Já a representação possui caráter mais amplo. Ela consiste em colocar uma coisa no lugar de outra, como se fosse outra, como a palavra em lugar do objeto. Para tanto, pode valer-se de diversos meios, contanto que estes obedeçam a uma regra conhecida, convencional ou não.
Dessas duas posições, pode-se já vislumbrar o motivo pelo qual a imitação nas artes tem sido contestada como precária, uma vez que o que imita nunca se assemelha ao imitado, favorecendo assim a asserção representativa. Contudo, é de se supor que desde Aristóteles houvesse ciência dessa discrepância. Logo, a pergunta que fica é por que se insistiu em falar sobre imitação. Como resposta, o mais provável é que com isso se pretendesse designar uma prática restrita, que buscasse de fato transpor da maneira mais ajustada os fatos do mundo para uma linguagem acessível.
Fica marcada aí uma diferença que se nota muito bem na separação entre realismo como estilo de época e realismo como corrente estética. No primeiro, há critérios formais bastante rigorosos pelos quais o real deve aparecer, o que o coloca na linha de uma visão de arte como imitação. É a literatura de Zola e Aluísio Azevedo, por exemplo. Já no segundo, como se encontra mais ligado à representação, o que importa é que de algum jeito o real brote e se faça presente, ainda que por vias simbólicas menos claras e diretas.
Isso o filósofo Lukács percebeu bem, e por essa razão preferiu situar sua estética como fundada na teoria do reflexo, ou seja, da arte que não é o real, e que também não só o imita, mas sim o reflete em sua essência, pelo que a obra de um Hoffmann pode ser vista como dotada do mais puro realismo.
Criamos aqui então a potência de um paradoxo. Há realismo sem realismo, em ambos os sentidos.
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