1
Era uma receita fascinante dos formalistas, e que terminou adotada por todo mundo. A literatura, para ser ela própria, deve causar de algum modo o estranhamento.
2
Ou seja, provocar o ainda não visto, não sentido, não escutado, não vivido. Qualquer coisa de novo e que aponte para caminhos antes ignorados, pondo a dizer-nos que a arte produz a intuição do devir ativo da existência, configurado no experimentar o que sequer se julgava viável estar presente.
3
Pode-se dizer que esse princípio criou uma bela história, e nunca se escreveu tanto e de maneira tão revolucionária como sob tal lema. Porém, a intensidade do gesto foi igual à do seu esgotamento. Culpa dos modernistas ávidos e dos delírios de progresso. Tivéssemos tido parcimônia, até hoje haveria florestas em que se podia entrar sem saber por onde.
4
Lágrimas, no entanto, não mudam o real. Logo, só podemos perguntar: o que nos resta?
5
Sim, tem algo que sobra. E esse algo tem a ver com a expandida cultura do academicismo, da referência, do já visto que se distingue na obra e se toma como sinal de um ente nosso, bem como de nossa inteligência. Pelo lado do artista, o que olhamos nele é se é capaz de fazer esse jogo da memória se encaixar bem, a ponto de parecer natural e – por que não? – criativo, quer dizer, capaz de dar um inusitado arranjo a envelhecidas imagens e termos.
6
Daí, retira-se um enunciar propositivo. Se a literatura de antes era de ESTRANHAMENTO, a de hoje é de RECONHECIMENTO.
7
O fato, bom ou ruim, surge como material. Cabe a nós, até que venha uma novidade – contraditório? – pagarmos o preço.
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